sábado, 16 de julho de 2016

Ela e ele*

                                                     

O chiar das antigas peças do autocarro, era só isso que se ouvia naquela viagem que já durava há mais de duas horas. Parecia interminável, principalmente quando o desejo da chegada do fim daqueles pensamentos só sucederia simultaneamente ao findar a longa viagem.
Duas horas e quinze minutos: o mesmo barulho, os mesmos pensamentos. Ele não lhe saia da cabeça. Ela já não sabia o que fazer. Durante um longo tempo tentou arduamente decifrar ser tão enigmático, contudo em vão. Sentia-se cansada. Um cansaço que não lhe permitia lutar, não lhe dava mais força para continuar. A luta era diária. A coragem desvanecia-se. Há um ano que andava a fazer os impossíveis para que tudo desse certo, todavia parecia-lhe que os astros conspiravam contra si. Queria estar com ele, sentir a sua pele, o seu perfume, ver o sorriso, o seu olhar e rir-se; rir-se com as palavras que os suaves lábios dele proferiam. De tudo isto, ela tinha a certeza. Tudo isto parecia que ele evitava. Aquele jogo era jogado por duas pessoas e ninguém sabia ao certo quem comandava. Sempre que ela tentava desistir, ele aparecia repleto de carinho, palavras fofas, gestos meigos, olhares ternurentos e toques suaves que a derretiam. Fazia-a sentir-se importante e especial e era disso que ela precisava. Nessas alturas, ela ganhava força para lutar e era aí que ele parecia ficar alheio a tudo, sereno como se tudo tivesse sido nada. Se já antes ela sentia dificuldade em cativá-lo por não conseguir ser para ele carinhosa como ele já pedira que ela fosse, agora, com todo este cansaço e sem respostas da parte dele, muito menos. Não restavam forças para jogar o jogo de o entender e o conquistar.

Duas horas e trinta minutos: a viagem termina. O pensamento permanece. Recorda o último olhar, o último sorriso, o último beijo, as últimas cumplicidades. Tal como a viagem, as forças tinham terminado e o cansaço vencera. No entanto, as recordações, essas, continuaram após a saída do autocarro, recordando-a a ela e a ele…

quinta-feira, 26 de maio de 2016

Fica*


      Foste. Vieste. Ficaste. Partiste. Mágoa que persiste e não passa. Saudade que corrói e deixa marca. Distância a dois passos. Presença ausente. E depois de tudo, fica a dor. A de teres partido, não a de teres ido embora. Fica a mágoa de ter acreditado que um futuro poderia existir e de que o passado seria mais do que a memória. Seria história. Fica a ferida que, em breve, espero, passará a cicatriz. Marca que não dói, todavia existe, persiste. Lembrança do que nunca foi, somente existiu. Passagem constante. Fica a lágrima a cair pelo rosto. Rola sem meta, sem destino, sem direção. No entanto, seca entre o peito, na origem, no coração. Fica o eu que quis ser nós. Fica. Porém, tu partiste.